h1

Trinta e um

02/01/2014

Mais um ano averbado à curta conta da vida. Trinta e um. O número entra em alvoroço pela janela emotiva dos sentidos, provoca um pé de vento na cabeça e desarruma a significação deste dia natalício. A vida afectiva adiada, nenhuma certeza, todos os sonhos verdadeiros de ser um homem do meu tempo por cumprir. Ao assentar isto no diário, vêm-me à lembrança as palavras secas escritas pela mulher de Tolstoi e às quais já recorreram Miguel Torga, no diário, e António Lobo Antunes, nas crónicas: “morei quarenta anos com Leão Nicolaievitch e nunca soube que espécie de homem ele era”. O bom da literatura universal é que a ductilidade da sua medida tanto remedeia dois génios como o Torga e o Lobo Antunes, como faz gala num desgraçado como eu. De resto, vivo comigo há trinta e um anos, sei de que cepa terrosa venho, conheço-me como ninguém, e também não sei que espécie de homem sou. Tirando os livros que leio, sou uma pessoa desinteressantíssima. Ou talvez seja – lembro-me agora do célebre episódio de Mozart, aos seis anos, a correr desamparado para o colo de Maria Antonieta e a pedi-la em casamento – uma criança que apenas cresceu para fora e vive num irreprimível estado de perplexidade, ansiosa que o amem incondicionalmente.

Deixe um comentário