Fóia, Monchique. Fui hoje mostrar ao sobrinho a minha Meca caleidoscópica, o único lugar patrício onde posso certificar-me de que os meus marcos existenciais ainda se encontram no sítio. Integrados na estamenha natural sob o vínculo tutelar do anonimato, subimos, subimos, e ali estávamos os dois, lado a lado no transe da consanguinidade moral com as serranias, de olhos almofadados nas tintas indefinidas de tamanha beleza.
– Olha, tio, daqui vê-se a terra toda do mundo! – irrompeu ele dos rebentos silenciosos da monotonia, como que a fazer-me redescobrir novidades intrínsecas a um panorama invariável tantas vezes repetido e contemplado nos sentidos.
E, sentados em cima de uma pedra aquecida ao sol, com os dorsos da serra em frente e um luminoso mar azul nivelado pela rasura das calmarias em pano de fundo, abraçámo-nos num poema de telúrica ternura: eu, um verso a menos nestas montanhas, que não rima senão assimilado em estrofes de tristeza maciça; ele, um verso a mais, cândido, com o mundo enraizado nos pés e uma paisagem aberta a todos os horizontes da vida.