Posts Tagged ‘Liberdade’

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Esperança

01/03/2013

Pinta os sonhos de verde!
Pinta um quadro de ilusões.
Na terra nenhum sonho perde
A cor das quatro estações.
Agita o leve pincel do ritual.
Maior dom natural
Que a liberdade?
Não é preciso!
Só essa renovada vontade
Pode pintar o irreal
Com a verdade
De um sorriso.

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Utopia

30/01/2013

Nem toda a liberdade
Nem as amarras do destino.
Tenho apenas a vontade
De ser como um menino
Que brinca na solidão da rua
E volta a casa fazendo o pino:
As mãos na Terra, os pés na Lua.

Não tenho toda a liberdade,
Mas procuro-a em cada passo
Que dou.
Como aquele pardal que poisou no terraço
E ao ver a imensidão do Espaço
Abriu asas e voou.

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Puxando o carro

17/10/2012

Que balsâmico seria se, depois de lavadas as ferramentas e arrumadas as mataduras diárias a um canto, eu me metesse pelos espinhaços ossudos desta serra a cabo e, sedimentado em cada pedra, abrolhado em cada arbusto e integrado no instinto selvagem de cada criatura animal, medisse com o estalão dos meus próprios passos até que rasos horizontes se estende a minha coutada de solidão. Mas não. A vida concreta é mais forte que as amarras das paixões abstractas. Os mapas têm que orientar, as actas têm que contar, o céu tem que chover, os ribeiros têm que inundar, os mortos têm que morrer, os vivos têm que viver. Vistos à luz mortiça da rotina, o quotidiano parece inútil e o trabalho um desperdício, uma escravidão a forças tirânicas alheias às nossas ambições. E como pegadas desenhadas na lama dos dias, apenas se sabe de quem trilhou o caminho aquilo que diz o cardado das botas. Para mim, nem isso quero! Quero que a assinatura dos meus actos tenha o registo neutral das caligrafias ruins e a precariedade do giz nas ardósias. Passar pela vida de forma tão ignota, tão anónima e tão clandestina que nem eu próprio dê conta da minha existência.

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Apocalíptico

07/10/2012

Tínhamos um Letes como testemunha
E um Éden que florescia num sorriso.
Éramos costela, carne e unha
De um sonho de Deus no Paraíso.
Mas quando cada um de nós supunha
Que havia tempo de sobra
No cimento eterno dessa obra
Erguida nas paredes da manhã,
Saiu do entulho a serpente
Cuspindo casca e semente.
E nós, discretamente, arrotámos maçã.

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Rebelião

05/10/2012

Dizem que tem que ser,
Que já estava escrito
– Cumprem-se ordens do Destino.
Façam lá saber a esse cretino,
Da parte deste proscrito,
Que não guardo lealdade
A essa dinastia de reis
Brutos, cruéis tiranos.
Que hei-de ter sempre a identidade
Dos ciganos.
Livre e à margem das leis.

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Liberdade

21/05/2012

Estou perdido. Mas lá vou reagindo como posso às desgarradas solicitações de Liberdade que, incessantemente, me vão roendo na consciência. Sozinho, a sós com a solidão, a ser inteiramente livre; junto dos outros, a fazer de conta.

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Liberdade

15/05/2012

Liberdade, sim, Liberdade!

Ar puro gritado a plenos pulmões.

Ousadia suprema da vontade

Sem donos, jugos ou outras restrições.

Liberdade de bicho bravo, fora da toca.

Expirada numa só baforada

Sem mãos ao rés da boca.

Liberdade. Liberdade a tempo inteiro,

De par em par, escancarada.

Última recompensa

De quem não pede licença

Para respirar no atoleiro

De uma pátria asfixiada.

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25 de abril: um enigma por decifrar

25/04/2012

Estamos desgraçados. A Liberdade ardentemente desejada pelos nossos pais e avós na profundidade de largos anos de silêncio doloroso, paga, sabe Deus, a que quilates de sangue e de lágrimas, desbaratada na retórica eloquente e rancorosa daqueles em quem, superficialmente, sufragamos a nossa pequenez. A essência da dádiva dessa Liberdade, humana por vocação, transformada numa excrescência tirana por perversão. É escusado. Somos um povo amnésico de alheados. As Revoluções, neste país, não passam de farsas outorgadas no palco incivilizado do ressentimento.

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Sentença

17/04/2012

Sou testemunha, réu e juiz

Em causa própria e em todas as circunstâncias.

Surdo à matriz

Das boas ressonâncias

Com que a vida me condena,

Cumpro a pena

Na reclusão da minha essência:

Subversivo,

Vivo

Acorrentado à voz da consciência.

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Liberdade

06/01/2012

– Tenho que me associar a isto, faz-me falta convívio para o que vem na velhice – disse a senhora a prolongar nos ombros as ondas melodiosas de uma jolda que cantava ao Menino.

– … – respondi-lhe calado, escorado por um silêncio sem idade, numa súplica interna, a pedir solidão eterna.

É. Isto da «penosa conquista de solidão» está a ficar cada vez pior dentro de mim.