Posts Tagged ‘Manuel do Nascimento’

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100 anos de nascimento

30/01/2012

O centenário de Manuel do Nascimento, pródigo escritor neorrealista, também não foi esquecido pela biblioteca escolar da Escola EB 2.3  de Monchique.

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Manuel do Nascimento e eu

04/01/2012

Escritor que é muito do meu entusiasmo, acho que já vos tinha falado de Manuel do Nascimento. Aqui ou noutro lado qualquer. Nasceu no dia 27 de Dezembro de 1912 no mesmo agro natal que eu. Este será, assim, o ano em que se assinalará o centenário desse dia natalício. A desfortuna anónima da morte tolheu-lhe a ânsia criativa no dia 30 de Dezembro de 1966. Dezasseis anos depois, eu nasci. Não. Não é por acreditar em coincidências. Nada disso. É, apenas, porque a repetição das datas e dos dias se cumpre aleatoriamente nas diferenças dos homens. O mundo é feito de gente que morre no mesmo dia que outros nascem e de gente que nasce nos dias em que outros morrem. Na realidade, é muito mais o espaço, a Serra de Monchique, o sentido condoído das palavras, que o mero sincronismo circunstancial do calendário a ligar-me a este autor neorrealista que tanto admiro.

No passado dia 30 de Dezembro, data em que o tempo, aleatoriamente, nos uniu, duas amigas infinitas, duas pessoas que me têm ensinado todas as possibilidades do céu humano, ofereceram-me duas primeiras edições de dois livros do autor: O Último Espectáculo, 1955, – entretanto republicado pela Junta de Freguesia de Monchique e os herdeiros do autor em 2006, –  e Mineiros, 1944. Pego agora nestas duas obras, olho para o poema (Conquista) fotografado de Miguel Torga que a baronesa me ofereceu, e é como se segurasse nas mãos trémulas o epicentro de um sismo. Do abalo emotivo, sobram as palavras que me foram deixadas num desses livros, e que o sismógrafo dos meus dias jamais apagará:

«Olá, Edu!

Prontinho para fazer o último dos vintes?

Isso quer dizer que és quase um Tritão… ou será trintão!? Enfim, seja como for, é sinónimo de sabedoria, maturidade, ponderação…

Bom, bom… deixemo-nos de filosofias!

O que interessa, agora, é mesmo a prenda que aqui está.

É só meia prenda. A outra metade está ainda em fase de processamento. Complementa lindamente esta metade, mas podem, ambas, viver separadamente. No entanto, a oura metade chegará atrasada (infelizmente), num dia, num mês e num ano diferentes.

Quanto a esta metade:

Se não gostares, podes devolvê-la a uma das ofertantes, já que ambas ambicionaríamos possuí-la, pois, como verás, é um espectáculo. Não obstante, a consideração, o respeito, o carinho (quase maternal) e a ternura que sentimos por ti é superior ao nosso egoísmo e ao egocentrismo. Sabemos também que a valorizarás muito mais do que nós. Mas tem cuidado! Não se parte, mas é frágil e não poderá estar ao alcance de qualquer mão!

Agora, vem a parte mais complicada:

Neste embrulho está a tua prenda, mas nem tudo o que está lá dentro te pertence! É tudo igual, mas há uma pequena, ligeira, subtil, mas valiosa diferença. Só a diferença é a tua prenda! Tudo o resto não te pertence e terá de ser devolvido à sua dona! (NOTA: o livro d’ O Último Espectáculo vinha dissimulado num labirinto de outros livros da segunda edição, empilhados como tijolos, numa caixa).

Só terás direito à tua prenda se descobrires essa diferença.

É que as coisas valiosas, verdadeiramente valiosas, não se compram, não se vendem, conquistam-se.

PARABÉNS, EDU!

O que nós queremos para ti é que sejas verdadeiramente FELIZ!

Monchique, 30 de Dezembro de 2011.

Paula e Graça

Devia existir uma gramática sentimental onde se pudesse descodificar a magnitude semântica de certos estremecimentos emotivos. A esta hora, vejo a minha fotografia num poema de Miguel Torga.  E abro os livros de Manuel do Nascimento nas mãos, novamente. Ali, nos dois vales encaixados das páginas abertas ao mundo, eles são um prolongamento das minhas mãos, das ondas do meu corpo, dos meus braços que se abrem como esses livros, num abraço indelével, afectivo e absoluto. Como o vento se entrega e se molda a todas as coisas que assopra, mesmo as mais remotas, intersticiais e insondáveis, eu abraço-me à ternura e carinho justificados naquele gesto. Um gesto alado, capaz de adoçar mesmo o mais casmurro, teimoso e duro dos corações. O meu coração feito de fragas.

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Los 33

14/10/2010

Esperei, com a paciência de 33 Jobs, pelo término das operações de resgate dos mineiros encurralados no deserto de Atacama para poder finalmente lavrar as palavras que me apetecem dizer sobre o assunto.

Solidário com as atribulações das vidas de cada um daqueles 33 homens, desesperadamente passadas nas profundezas da escuridão, não foi a primeira vez que me senti mineiro. Nem a segunda.

Na primeira, a descida de umas dezenas de metros nas Minas de Neves Corvo, durante uma visita de estudo da primária, apenas me fez perceber que há homens que vivem como as toupeiras. Em busca de tesouros guardados debaixo das pedras, entram nas entranhas da terra através roscas de artérias helicoidais e transformam a luz leve do dia na densidade do breu. Noite cerrada.

A segunda vez que me senti mineiro foi quando li Manuel do Nascimento, Engenheiro de Minas, escritor da minha terra e sofredor da mesma agónica opressão que tolhia de negrura o quotidiano dos mineiros de então. Aquilo que escreveu num conto chamado “Nada de Importância“, em o ” O Último Espectáculo“, é uma súmula dos últimos dois meses de vida dentro do tutano do deserto chileno. Basta substituir “quatro” por trinta e três, e “aldeia” por mundo:

« Levantei-me e fui à porta. O vulto de um homem esperava-me à distância.

– Que há?

– Abateu a galeria 5.

– Toda?

– Não, senhor engenheiro.

– Estava lá alguém?

– Quatro [33] homens.

– E então?

– Ficaram lá todos.

[…]

Era preciso chegar. Outros homens corriam também. Toda a aldeia [Mundo] se levantaria ao saber do desabamento.»

Ontem, voltei a sentir-me mineiro, multiplicado por 33. E chileno, também. Nos ossos, nos nervos, na carne, na pele e nas pilosidades daqueles homens. Na intemporalidade, universalidade, pertinência e sagacidade da pena de Manuel do Nascimento.