Posts Tagged ‘Eça de Queiroz’

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Verdade, verdadinha

16/08/2010

Isto de ter morrido há cento e dez anos e continuar com palavras duradouras, que permanecem intocáveis por estes dias e outros, longos, que lhes seguirão, não tem muito que se lhe diga, não. Tem, sim, muito por onde ler e reler, mesmo para aqueles que, como eu, já lhe descascaram a omnipotência da obra quase toda.

Vergonha, vergonhita é conhecer Eça de Queiroz apenas por aquela sebenta amarela, de lombada preta, que nem digna de catálogo sumulista d’ Os Maias é!

Ainda assim, se corrermos às estantes de trás ou às prateleiras das livrarias e bibliotecas, «ainda o apanhamos!

– Ainda o apanhamos…»

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O tempo de Eça de Queiroz

19/06/2009

Aproximava-se o solstício de Verão e “só me acudiam sordidezes paralelas, em calão teimoso: – «é de rachar»! «está de ananases»! «derrete os untos»! …” (Eça de Queiroz – A Correspondência de Fradique Mendes).

Imagino-me, vezes sem conta, com o Zé Fernandes e o Jacinto, ao lado do Gonçalo, do  Titó e do Videirinha, rimando ao som do violão, (A ilustre casa de Ramires), do Carlos, do Cruges, do Ega e do Alencar (Os Maias), «com palmadas pelo ventre», acompanhado ainda pelo  Teodorico, o Alpedrinha, o Potte e o Dr. Topsius, «da imperial Alemanha», «bebendo vasta cerveja»(A Relíquia), praguejando contra este calor de ananases e efabulando o país.

Bem vistas as coisas, na minha cambada de amigos, basta trocar os verdadeiros nomes pelos das personagens de Eça, mas «Vencidos da Vida» é coisa que, decididamente, ainda não somos!

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Eça é que é Eça

29/05/2009

Ainda a espinha se afeiçoava ao aconchego da cadeira e mal pude não reparar naquela senhora. Com os cabelos amarelados, repassados pelo secador, vestido “sem costas” e toilette encharcada em colónia de baunilha rasca, lia, à pressa, uma folha de apontamentos escolares, certamente pertença da filha, uma belfa adormecida prostrada a seu lado. No título da folha podia ler-se: “Os Maias – Resumo“.

Atirados de imediato às ripadas do cajado, dando início à peça, os primeiros acordes do Cruges lembraram-me o meu livro de bolso d’ Os Maias, de capa avermelhada, riscado e rabiscado com anotações didáticas e outras iconografias aludindo às aparvalhadas paixões do secundário.

A arrebatadora interpretação do elenco encenado por Rui Mendes, o aclamado Duarte do Duarte & Ca., correspondeu fielmente a cada frase do livro, fazendo-me reencontrar as imagens que idealizei aquando da leitura da obra, pela qual desembolsara 700 paus, cerca de 10 anos antes.

O Maestro Cruges, na quase muda  intelectualidade da sua ignorância, continua a ser o meu personagem preferido. Hoje, ainda me revejo no diletantismo de João da Ega e Carlos da Maia, tal como mantenho a ideia de que o ridículo e a infâmia do Dâmaso Salcede são levados da breca. 

Lá para o fim do espectáculo, um enfastiado bocejo ecoou no auditório, despedaçando a plateia.  A senhora emperiquitada da fila da frente, abriu também a sua boca de hipopótamo, contagiada. A filha, de xaile de seda branca às costas  e cabeça babando sobre o ombro da mãe, há muito que adormecera, logo às primeiras notas do Cruges. 

Mal caiu o pano ouvi a emperiquitada senhora balbuciar a uma outra, sentada à sua esquerda: «Eça de Queiroz é um dos maiores escritores do romantismo nacional, mas felizmente que hoje também os temos dos bons! Há a nossa Margarida Rebelo Pinto. A adaptação dos seus romances  ao teatro também  era capaz de resultar…»  

O ronco daquela criatura fedendo a baunilha, deixou-me à beira de um AVC. Esgazeado, vi a cabeça do Dâmaso sobre os destapados ombros da sujeita. Só tive tempo de correr dali para fora, antes que aqueles lombos ao léu me pedissem vergastadas…

«Chique a valer, hein?!»